quarta-feira, 26 de março de 2008

A arte da Solidão

Orquídia, óleo sobre tela, 2001, por Alexandre H. Reis

Ao convidar meus alunos de “Filosofia e Ética” a ouvir algumas lições de Sócrates, confrontei-me com uma sabedoria que se mostra demasiado simples: o que temos a aprender verdadeiramente com nós mesmos? O que tenho entendido, nestes primeiros dias de setembro, é que o retorno a si mesmo, o voltar o olhar para cada um de nós, é tarefa penosa que revela um bocado daquilo que sempre permanece esquecido em nosso dia-a-dia. Não compreendemos verdadeiramente quem somos se não experimentamos a solidão. E o que é mais difícil de afirmar é a necessidade de que devemos estar a sós em meio a uma multidão que cega nossos olhos para uma interioridade que, temo, está desaparecendo em meio a um mundo cada vez mais acelerado e mais convidativo para o entretenimento. Creio, assim, que o entretenimento é o grande flagelo de nossos tempos modernos. Com nossa inteligência dispersa em uma série de problemas sociais e de prazeres coletivos, acabamos de olhos bem fechados para nós mesmos.
Sócrates, o velho tagarela que sempre interrogava seus compatriotas sobre a verdade de seus conhecimentos, parece ter deixado algumas lições imprescindíveis para a verdadeira sabedoria: coloca-te sob suspeita! Mas, o que este duvidar de si mesmo pode nos dar? Quem está, hoje, dois mil e quatrocentos anos após a sua morte, disposto a abrir mão de todo prazer imediato, de todos os convites que o mundo moderno tem a nos ofertar, para se voltar para si mesmo e buscar, a partir de si, um conhecimento que seja ao mesmo tempo simples e revelador?
O nosso mundo parece ter transformado a arte em entretenimento: a arte já não é a revelação do espírito, e sim o seu mais fugaz passa-tempo. A música, que educada o espírito para o sentimento sublime, é hoje um barulho que agita o corpo, e torna a alma ainda mais estranha a si mesma. Nossa educação tem se tornado um treinamento que promete uma profissão, nada mais. Neste sentido, penso estarmos muito ocupados para compreender realmente o que Sócrates propunha: o conhecimento de si mesmo é a suprema tarefa capaz de libertar o homem de suas amarras sociais, capaz de libertá-lo da prisão das convenções sociais, esta falsa noção de verdade que tem se tornado a grande mentira das sociedades de massa. Rir de si mesmo, assim compreendo toda grande sabedoria. Mas o riso, insisto, este não se levar a sério, nos dá, primeiramente, a grande angústia que pode nos despertar para o pensamento. O riso nos dá, para além deste primeiro momento angustiante de se descobrir um ser vazio, toda possibilidade de alegria. É preciso, assim, inicialmente convidar-se a si mesmo para o debate, para a revisão dos próprios valores que guiam nossas ações, e, num segundo momento, quando se descobre a fragilidade de nosso próprio ser, enfrentar o mundo e suas mentiras para, no final, descobrir a verdadeira arte de se estar no mundo, a sublime e divina arte de sorrir!
Sócrates, se levado a sério, deixará cada um de nós confuso e em estado de perplexidade, e é aí que se dá o início de uma aventura que poucos hoje em dia se dispõem a buscar: a aventura do pensamento, a arte de pensar.

7 comentários:

Alexandre H. Reis - Filosofia e Visão de Mundo disse...

Mariza Mariette
Qua 04 Jun 2008 09:50

Só este ano comecei a ter Filosofia,mas compreendi que como ser humano não posso viver apenas como indivíduo,visto ser constituída por um a componente naturalmente social. É verdade que actualmente se eleva esta componente ate ao mais absurdo nível, mas eu acho que tudo isto é causado pelo medo, sentimento que aniquila qualquer artista, e pela competição louca, ou preconceitos que as pessoas têm para com os antigos, cujas obras são fantásticas.Acho que é desmotivador nunca serem mostrados textos jovens, obrigando-nos a querer o mesmo tipo de sucesso que ,por exemplo Sócrates. É impossível, olhando apenas para plano da historicidade entre as diferentes épocas. Ao tomar consciência disso, o artista não hesita e , para não se afogar no próprio desapontamento produz obras inspiradas na sociedade actual: completa em hipocrisia social onde as pessoas sós nunca estão sozinhas. É assim que desvanecem os melhores artistas

Alexandre H. Reis - Filosofia e Visão de Mundo disse...

Jessica
Sáb 01 Mar 2008 02:38
Olá, Alexandre!
Então, eu sou uma das garotas que conversou com você hoje depois da palestra, não sei se você se lembra.
Ia comentar seu texto e já estava escrevendo demais, acho melhor nos comunicarmos por e-mail, já que, sim, levei a sério quando você disse que poderíamos nos corresponder! (mas você ainda tem chance de voltar atrás, viu? \o/)
Eu vou deixar meu e-mail no comentário e ficaria muito feliz em receber o seu.

Alexandre H. Reis - Filosofia e Visão de Mundo disse...

LEANDRA AMARO
Sex 15 Fev 2008 18:54

Estive apreciando seus escritos,sendo eu uma admiradora e aprendiz nesse tempo,fiquei a me perguntar,sobre o papel da religião na atualidade,quando me deparei e estou a refletir que a Igreja pode ter o papel de proporcionar essa solidão ao ser ...a necessidade de se deparar conssigo mesmo e de criar a arte da sua vida e transformar a sua história numa musica que retrata a sua alma,um nível de espiritualidade com palavras transformadoras...
obrigado por me acrescentar sobre a arte...
um abraço.

Alexandre H. Reis - Filosofia e Visão de Mundo disse...

LEANDRA AMARO
Wanderson Oliveira
Sex 21 Set 2007 17:54

Creio ser a solidão um momento de se recompor. Sim, o mundo superficial de luzes e cores em que estamos inseridos, nos "desarruma" ao tentar que nos conformemos a ele. Na solidão e no silêncio conseguimos rebuscar nossa essência, nossa pessoalidade. Sem esses momentos corremos o risco de deixarmos de ser únicos para ser apenas mais um. É angustiante sentir que corremos esse risco. Mais ainda é sentir que à sua volta, muita coisa não está mudada mas apenas "moldada".
É o que penso.
Também gosto de dar a cara a tapa.

Alexandre H. Reis - Filosofia e Visão de Mundo disse...

venille
Seg 17 Set 2007 23:09

Boa tarde Alexandre!
estava caçando blogs criveis na rede e me deparei com o seu. Um filosofo perdido na rede. Fantastico.
Como sou novo por aqui estou tentando me enturmar.
Também criei um blog, e meus poemas alguns dizem que tem algo de pessimista, nostalgico. então te pergunto: serão estes alguns sintomas filosóficos que afloram? Como constantemente o verdadeiro esta em nos mesmos devemos então aprender a ezalar estes espinhos, como bem li em seu texto "A arte da solidão".
No mais é isso ai Alexandre, se puder visite meu blog. Até mais!

Alexandre H. Reis - Filosofia e Visão de Mundo disse...

DARLY MIRANDA
Ter 04 Set 2007 19:55

Professor,
experimentar a solidão e´, antes de tudo, ter a certeza de que sou a melhor companhia para mim mesma. Se eu não tiver isso muito firme, com certeza vou me refugiar nos inúmeros convites para o entretenimento improdutivo.
Agora, com relação a descobrir a verdadeira arte de se estar no mundo, esta aí eu ainda não alcancei e nem sei se um dia chegarei a esta descoberta.
Talvez porque eu tenha mais curiosidade em saber se existe alguma arte depois da morte; porque não consigo compreender que uma máquina tão perfeita como o ser humano só leve no final um amontoado de terra na cara.

Alexandre H. Reis - Filosofia e Visão de Mundo disse...

Alessandra
Seg 03 Set 2007 00:19

Alexandre, muito pertinente e muito necessário este artigo que nos leva a uma reflexão sobre o mundo em que vivemos, e a falta de oportunidade de estarmos com nós mesmos, nos conhecendo, nos entendendo ou pelo menos tentando entender todas essas dúvidas e angústias que passam em nós a todo momento. Não conseguimos sequer nos dar a oportunidade de ficarmos sozinhos, quem consegue hoje deixar a televisão desligada quando está sozinho? Ficar escutando o silêncio? Ou escutando sí mesmo? Não, tentamos a todo momento nos distrair, prestar atenção em algo, alguma notícia, e não em nós mesmo.
Ainda é tempo de refletirmos sobre isso.

Casa velha

Casa velha
esta é a casa que meus pais moraram no início dos anos 60

Cabela de Homem

Cabela de Homem
esta é prima da minha obra. Eu a concebi numa noite em que a lua estava tão amarela que parecia o Sol... ela é filha da noite... sem lâmpadas.

Josemar

Josemar
Este é o josemar, escultura em argila. A miniatura em sua testa fiz somente para a fotografia, com macinha de modelar

Figueira

Figueira
pintado por mim em 05/01/2007

O cinturião de Rembrandt

O cinturião de Rembrandt
eis o guardião de minha morada

detalhe

detalhe

Cacilda

Cacilda
produzi esta escultura em 2000